O projeto para transformar o Jardim de Alah num oásis do Rio

Espremido entre Ipanema e o Leblon, o Jardim de Alah é um território esquecido há anos.
Rebaixado, cercado por grades, sem estrutura e sem vida, o parque virou símbolo da decadência e da desigualdade urbana da Zona Sul.
“Hoje, o Jardim de Alah é cercado por um quilômetro e meio de grades e só serve aos poucos moradores que estão atravessando a rua. Ele não serve à cidade,” disse ao Metro Quadrado o arquiteto Miguel Pinto Guimarães, sócio do consórcio que fará a revitalização do parque e tem a concessão para operar o equipamento por 35 anos.
Depois de uma década de planejamento e anos de batalhas judiciais, as obras do parque acabaram de começar, o que só foi possível depois do consórcio vencer uma dezena de ações na Justiça que tentavam barrar a concessão do espaço à iniciativa privada.
As brigas custaram caro. O investimento – que inicialmente custaria R$ 110 milhões – agora vai ficar em mais de R$ 150 milhões devido ao tempo perdido esperando o resultado dos processos.
O projeto vai elevar o nível do parque – que hoje está abaixo da rua – e usar a parte subterrânea para comércio, banheiros, uma creche municipal, ginásio, estacionamento e serviços públicos.
“É um projeto de acupuntura urbana. Vamos construir 7.500 m² de ABL e um total de 15.000 m², mas sem perder nenhum metro de parque, porque tudo o que é construído fica embaixo da área verde,” disse João Sousa Machado, sócio de Miguel na incorporadora Opy.
A operação do parque será financiada pelo que os arquitetos chamam de “benfeitores”: empresas que vão adquirir cinco cotas anuais de R$ 7,6 milhões para a manutenção do local.
Três grandes marcas – uma de bebidas, uma montadora e um banco – já fecharam cotas, e outras negociações estão em andamento.
Cada cota dá direito à exposição da marca no mobiliário urbano, ativações culturais e eventos no parque, que depois da revitalização tem tudo para virar um programa de fim de semana para as famílias.
O interesse da iniciativa privada em assumir a revitalização foi uma solução prática para o Poder Público, que concentra seus esforços principalmente em melhorias na Zona Norte e na Zona Oeste da cidade.
“A iniciativa só avançou porque foi provocada de fora para dentro, e não o contrário,” disse Sérgio Conde Caldas, outro sócio da Opy.
Além da transformação do espaço, o projeto quer mudar a lógica de exclusão que o parque simbolizou por décadas.
“Por incrível que pareça, revitalizar o Jardim de Alah virou motivo de resistência de uma parte da elite local. Mas o que eles defendem, no fundo, é o muro invisível que separa os moradores da comunidade Cruzada São Sebastião do restante do bairro,” disse Miguel.
“O parque abandonado é um símbolo desse preconceito. Para eles, é melhor vazio do que compartilhado.”
Moradores que se opõem ao projeto também se dizem preocupados com a questão ambiental – e que o espaço vire um mall.
A derrubada de 130 árvores foi usada como argumento mais recente pelos grupos contrários à revitalização. Os arquitetos, no entanto, dizem que quem levanta esse número omite o fato de que o projeto prevê o plantio de 300 novas árvores nativas de Mata Atlântica.
“Esse número virou folclore. Muitas dessas árvores estavam doentes ou mal localizadas, e serão substituídas ou replantadas com manejo adequado. A ideia é ampliar a biodiversidade e não reduzir a vegetação,” disse João.
“Qual shopping tem 9% de loja e 91% de parque? Nenhum no mundo,” disse Miguel.
Ao todo, o novo Jardim de Alah terá 45 pontos comerciais entre lojas, restaurantes e quiosques, inspirados em modelos internacionais como o Time Out Market, em Lisboa, e o Mercado San Miguel, em Madri.
A requalificação do espaço inclui ainda três passarelas costurando os dois lados, e uma integração direta com uma escola municipal próxima ao parque, que passará a fazer parte do complexo.
A proposta também prevê a construção de uma nova creche municipal no Jardim de Alah. Com 1.200 m², a estimativa é que só essa unidade cubra quase 40% do déficit de 800 vagas de creche na Zona Sul.
O parque também terá uma agenda permanente de atividades culturais, esportivas e educacionais.
Já estão firmados acordos com a CBF, para aulas gratuitas de futebol; a NBA, com escolinhas de basquete; a escola teatral O Tablado; e artistas visuais que devem contribuir com a curadoria de um parque de esculturas a céu aberto.
“Ainda há muita dificuldade em aceitar que um projeto feito por empresários não tem foco comercial. O foco é urbano, social e ambiental,” disse Miguel.
Outro sócio do projeto é o empresário Alexandre Accioly, um empreendedor serial que é dono da rede de academias Bodytech, das casas de shows Roxy e Qualistage, e do restaurante Casa Tua.
Para Accioly, o novo Jardim de Alah tem potencial para se tornar um novo marco urbanístico na cidade.
“O Jardim de Alah estava abandonado há 50 anos e nunca foi um parque vivo, com vitalidade,” disse. “Isso aqui é um presente para o Rio. Nós vamos fazer história com esse projeto.”
Se tudo der certo, o novo Jardim de Alah fica pronto no início de 2027.