Opinião/ A hotelização das torres corporativas

Já é realidade nos Estados Unidos: os prédios de escritórios estão passando por um processo de “hotelização”.
Os novos empreendimentos corporativos triple-A estão chegando ao mercado americano com uma série de amenities: creches no modelo day care, lavanderia de roupas, lavagem de carros, mercados orgânicos, cuidados com pets, feiras temáticas e sazonais e até eventos gastronômicos e de degustação de vinhos.
É o que o mercado americano chama de experience management (XM).
O movimento representa mais um esforço para estimular a volta dos funcionários ao regime presencial no pós-pandemia.
A expectativa é que as políticas de retorno ao regime presencial se intensifiquem ainda mais até 2030, pelo menos, reforçando a hotelização.
Um estudo global da JLL estima que edifícios que contam com essa gestão de atrativos têm uma demanda 12% maior dos inquilinos em comparação com ativos imobiliários similares sem essas ativações.
Na média, houve aumento do aluguel de aproximadamente 7% e de 2,5% na ocupação dos ativos. Mais de US$ 1 bilhão foi gerado em valor agregado para proprietários e locatários.
Um grande empreendimento em Boston, com cerca de 45 andares e mais de 120 mil metros quadrados de área locável, faturou mais de US$ 430 mil com conferências e eventos no primeiro ano de XM.
Desde que a estratégia foi adotada, o aluguel médio no empreendimento aumentou de US$ 4,80 per square foot para US$ 6,30 – mais de 30% de incremento.
Um outro exemplo relevante é um portfólio de edifícios corporativos em Washington, com aproximadamente 150 mil metros quadrados de área locável, distribuídos entre ativos triple-A e classes inferiores, como A e B.
A implementação de soluções focadas em gerar experiências positivas resultou em uma melhoria significativa na satisfação dos inquilinos e na absorção dos empreendimentos que adotaram o XM.
Desde 2022, esse portfólio registrou um aumento de 5% na absorção, enquanto ativos similares nas mesmas localizações apresentaram uma contração de 1,5%.
Além disso, os edifícios que contam com soluções de XM apresentam uma taxa de ocupação 7% superior em comparação com ativos similares sem essa solução.
Mas não basta para os proprietários de torres corporativas investir em amenities sem entender o perfil dos seus ocupantes.
Pesquisas mostram, por exemplo, que 50% dos ocupantes preferem eventos noturnos (19h às 22h), seguidos por 40% de adeptos de eventos à tarde (12h às 18h).
Os dias mais populares para eventos são quinta-feira (25%), quarta-feira (20%) e sexta-feira (19%). A temática preferida é o bem-estar (21%). Já 17% gostam mais de eventos ao ar livre e 15% dizem ter interesse específico por feiras de produtos e serviços.
A solução para um empreendimento não é, muitas vezes, ideal para outro. As necessidades e comportamentos mudam – o tempo todo, aliás. Por isso, é preciso também trazer flexibilidade e inovação para essa estratégia.
No Brasil, há algum tempo, observamos iniciativas pontuais de ativações em edifícios corporativos.
Nos últimos anos, temos observado um aumento significativo nas ativações promovidas nos empreendimentos brasileiros. No entanto, muitas dessas iniciativas ainda ocorrem de forma isolada, sem o suporte de equipes especializadas, o que limita seu potencial de impacto.
Quando há uma estrutura dedicada à frente dessas ações, ganha-se não apenas consistência e frequência na execução dos eventos, mas também uma leitura mais estratégica e holística das necessidades dos usuários dos ativos.
Já é possível ver movimentações concretas nesse sentido, com empreendimentos em regiões como Faria Lima, Chácara Santo Antônio e até mesmo em outros estados passando a contar com orçamentos próprios para iniciativas voltadas à experiência do inquilino — e, mais recentemente, com times focados exclusivamente nessa frente.
A expectativa é que essa estrutura traga ainda mais tração para o mercado, elevando o patamar de entrega percebido pelos ocupantes. Assim como em outros mercados, acreditamos que essa será uma forte tendência que passaremos a observar no Brasil a partir de agora.
Esse movimento promete conferir maior solidez e consistência às ativações, resultando em um mais engajamento do público e na valorização dos ativos.
O fato é que os escritórios não podem ficar parados no tempo. Novos formatos, novos usos, novas experiências devem estar no horizonte de proprietários e investidores, garantindo que os ativos se mantenham relevantes e competitivos em um mercado que disputa cada metro quadrado.
Murillo Azevedo é gerente de planejamento estratégico da JLL.