As fachadas ativas estão virando fachadas fantasmas

Uma boa parte das fachadas ativas que estão se proliferando por São Paulo tem se transformado em verdadeiras fachadas fantasmas.
(Glossário: fachadas ativas são áreas de comércio nos térreos de prédios residenciais ou corporativos que dão para as calçadas e promovem mais fluxo nas ruas).
Como muitas incorporadoras incluem fachadas ativas em seus prédios residenciais apenas para receber o benefício previsto no Plano Diretor, tem sido comum encontrar espaços mal projetados e sem aderência.
O resultado: o aumento de placas de “aluga-se” e “vende-se” pela cidade, em vez da desejada mistura entre comércios e residências para gerar mais segurança e descentralização do varejo.
“O que temos visto é que muitas dessas fachadas estão aguardando um locador,” Claudio Bernades, vice-presidente do Secovi-SP, disse ao Metro Quadrado.
O Grupo Maximus, de Rodrigo Abrahão, uma incorporadora que também compra fachadas ativas para gerar renda com o aluguel dos lojistas, tem encontrado dificuldades para achar bons pontos.
Os espaços com os quais se depara têm apresentado problemas como falta de vagas para carros, ausência de docas para descarga de produtos, restrições para o uso das marcas das lojas na entrada e pé direito baixo. Em pontos que poderiam ser usados por restaurantes, por exemplo, não há saída para a exaustão da cozinha.
“Se for um lugar que já está pronto e o projeto estiver ruim, eu não vou comprar,” disse Rodrigo.
O estímulo às fachadas ativas vem do Plano Diretor sancionado em 2014 pelo então prefeito Fernando Haddad.
A intenção da Prefeitura era a descentralização dos comércios de eixos já abastecidos, gerando mais conveniência para os moradores dos bairros e levando circulação para áreas inseguras.
Ficou definido que essas lojas entram como áreas não computáveis nos projetos, sem consumir o coeficiente de aproveitamento.
Dependendo do zoneamento, as empresas podem adicionar de 20% a 50% na área construída com fachadas ativas, sem pagar mais outorga por isso.
Em regiões situadas nos eixos de transportes, como no entorno de estações de metrô e ao longo de vias com corredores de ônibus, empreendimentos em terrenos acima de 10.000 metros quadrados são obrigados a ter fachada ativa.
Com o incentivo, a cidade registrou crescimento de 41,6% no número de edifícios com fachadas ativas nos últimos três anos, segundo dados da Urbit. Entre 2022 e 2024, os lançamentos desse tipo superaram os do período de 2019 a 2021.
Foram 289 empreendimentos lançados nos últimos cinco anos, distribuídos por bairros como Vila Madalena, Itaim Bibi, Vila Mariana e Brooklin.
E a vacância criada por projetos não adequados acabou sendo aprofundada pela pandemia.
“As empresas agora estão tendo que fazer ajuste nos preços de locação ou de venda dessas unidades para que estas sejam absorvidas e operem como foram planejadas,” disse Claudio Bernardes.
Victor Hirata, gerente sênior de retail services da CBRE, diz também que parte dos projetos de fachadas foi feita sem pensar numa perenidade.
“Um bom projeto precisa ser longevo, não apenas ser aceito pelas boas redes varejistas no momento da entrega,” ele disse. “Quando um imóvel é bem concebido, é possível posicionar, alugar ou vender anos antes da construção ficar pronta,” disse.
A Prefeitura diz que revisou o Plano Diretor e a Lei de Zoneamento, e que as regras para as fachadas ativas foram aprimoradas. Entre as novas adições, está o incentivo à implementação de praças urbanas pelos empreendimentos, somadas às lojas.
Com a reabertura do varejo no pós-pandemia, as incorporadoras foram apresentando projetos menos problemáticos, para atender melhor às lojas que estavam retomando as atividades. Ainda assim, as zonas Sul e Oeste, que já tinham menos demanda por lojas, seguiram com mais vagas disponíveis.
Com esse vácuo de mercado, algumas empresas têm aproveitado para se diferenciar.
A incorporadora MagikLZ, por exemplo, tem evitado incorrer no erro de deixar para projetar as fachadas ativas por último, com os terrenos que sobram.
“Temos que equilibrar os pratos. Por isso buscamos pensar as fachadas ativas desde o início dos projetos residenciais. Se não funcionarem, fazemos apenas os apartamentos,” disse o CEO Ricardo Zylberman.
A HBR Realty, que tem uma rede de fachadas ativas – a ComVem, com 37 em operação e outras 25 em desenvolvimento – viu a oportunidade de criar uma nova linha de receita gerindo o aluguel de lojas para outras empresas.
Alexandre Nakano, CEO da HBR, diz que as fachadas ativas acabam entregando a experiência de rua com qualidade de um shopping center.
“Nós estamos tentando mostrar para o mercado que, quando bem feito, o benefício econômico e até de posicionamento na questão urbanística da cidade é muito grande,” ele disse ao Metro Quadrado.