Estão faltando galpões para o setor farmacêutico

O estoque de galpões logísticos no Brasil tem crescido em ritmo acelerado desde a pandemia – mas o chamado mercado de life sciences está fora da festa.
Indústrias farmacêuticas, de biotecnologia e equipamentos médicos estão tendo dores de cabeça para encontrar imóveis que atendam às exigências técnicas e regulatórias do setor.
A dificuldade em encontrar um espaço prolonga prazos, eleva custos e muitas vezes obriga essas empresas a bancarem reformas complexas por conta própria.
Enquanto uma operação logística comum leva de três a seis meses para começar a funcionar, uma de life sciences pode levar de seis a 10 meses — um tempo até 60% maior, segundo dados da JLL.
Essa demora não é por acaso.
As empresas de life sciences precisam lidar com exigências da Anvisa e das vigilâncias sanitárias locais, que incluem controle de temperatura e umidade, sistemas de filtragem de ar, ambientes estéreis, vedação específica em portas e janelas, e infraestrutura elétrica específica.
“São ambientes onde se trabalha com materiais tóxicos. Não dá para improvisar. A estrutura do imóvel precisa garantir segurança e estabilidade operacional,” Ricardo Hirata, o diretor de locação industrial da JLL, disse ao Metro Quadrado.
A situação se complica ainda mais por conta das restrições de zoneamento urbano.
Para instalar operações que envolvam o manuseio de substâncias químicas ou biológicas, é necessário estar em zonas industriais específicas, o que reduz drasticamente a quantidade de áreas disponíveis.
“Muitas vezes, o imóvel até parece adequado fisicamente, mas está em uma área onde não é possível obter a licença da vigilância sanitária ou da Anvisa.”
Segundo o diretor, as empresas chegam a negociar locações e, só depois, descobrem que não poderão operar legalmente no local.
De acordo com a JLL, 127 empresas de life sciences operam em centros logísticos no Brasil, somando 859 mil m² de área locada, com mais de 95% em condomínios de alto padrão.
O estado de São Paulo concentra 68% da área locada no país, e os principais polos são Cajamar, Embu, Guarulhos e Jundiaí.
Minas Gerais também se destaca, especialmente em Varginha, onde o condomínio Citlog Sul de Minas abriga quatro grandes farmacêuticas — Eurofarma, Libbs, Daiichi-Sankyo e Apsen — que somam 57 mil m² ocupados.
Mas incentivos fiscais têm atraído também operações para regiões como Goiânia, Salvador e Recife.
O descompasso entre demanda e oferta levou muitas empresas a buscarem os built-to-suits, ou investirem para adaptar galpões próprios ou alugados.
“Mas ainda assim o risco é alto demais para o dono, porque se a empresa sair, o imóvel fica difícil de alugar,” disse André Romano, o gerente da divisão logística e industrial da JLL.
E os custos dessas adaptações são altos: de R$ 1,5 mil a R$ 2,5 mil por m² em intervenções básicas, e podem chegar a mais de R$ 6 mil por m² em instalações com produção estéril.
Enquanto nos Estados Unidos existem cerca de 18 milhões de m² dedicados exclusivamente a laboratórios — conhecidos como lab properties —, esse conceito ainda engatinha no Brasil.
“Aqui, a demanda não é recorrente a ponto de atrair investimentos em produtos específicos,” disse Romano.
A exceção que confirma a regra é o Master Labs, condomínio de laboratórios com 14 empresas de life sciences instalado na avenida Guido Caloi, em São Paulo.
Construído em 1991, o empreendimento foi adquirido pela Credit Suisse Hedging-Griffo em 2012 e possui 14,3 mil m².
“O Brasil criou um mercado próprio para galpões last mile, impulsionado pelo e-commerce. Mas não vejo isso acontecer tão cedo com life sciences,” disse o gerente.
“É um setor exigente demais para um mercado ainda tão pouco estruturado.”