Os bastidores da obra do novo prédio do Masp

Os bastidores da obra do novo prédio do Masp
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Newton Simões gosta de dizer que sua empresa é uma espécie de anjo da guarda do mercado da arte de São Paulo.

Vinte anos atrás, quando a Bienal se preparava para mais uma exposição, o celular do fundador da Racional Engenharia tocou de madrugada para resolver um pepino que apareceu de última hora.

Uma chuva de granizo havia atingido a região no dia anterior e a água estava transbordando para dentro do edifício, no Parque do Ibirapuera. O então diretor da Bienal estava desesperado porque os curadores queriam levar embora as obras (que incluíam trabalhos de artistas como Picasso), e pediu a Newton que desse um jeito.

O granizo que caiu sobre o telhado da Bienal estava entupindo as tubulações, e a chuva não conseguia descer, o que fazia a água escorrer para dentro.

Newton Simoes

“Enchemos dois ônibus com 60 pessoas e chegamos lá às 4h30 da madrugada para desentupir as tubulações e fazer a reforma necessária para pelo menos a Bienal conseguir funcionar,” Newton disse ao Metro Quadrado.

Como os diretores da Bienal costumam se revezar com os do Masp, a Racional virou um nome procurado com frequência pelo mercado da arte. A empresa também já trabalhou no reforço das vigas do Masp, o projeto de Lina Bo Bardi.

Foi esse grau de confiança que levou a Racional a vencer a concorrência para trabalhar nas obras do novo anexo do Masp na Av. Paulista – um prédio dos anos 1950 que fica ao lado do icônico edifício desenhado por Lina e foi comprado pelo Masp para ser retrofitado.

A reforma levou quatro anos, e o novo prédio – um projeto da Metro Arquitetos, de Martin Corullon e Gustavo Cedroni – vai ser inaugurado semana que vem com cinco novas exposições.

Mas não foi um passeio no parque.

Antes um prédio residencial, o edifício foi adquirido em 2005 com patrocínio da Vivo e chegou a ter um outro projeto de reforma, mas as obras foram paralisadas depois que a Lei Cidade Limpa foi aprovada em 2013, inviabilizando a exposição publicitária que estava nos planos da Vivo.

A Racional deu início à sua reforma em 2021 – e logo viu que teria de fazer jus à fama de “anjo da guarda”.

No projeto original, além de adaptar o prédio residencial para se tornar um museu, a ideia era construir mais andares e criar um espaço para restaurante.

“Mas quando entramos, vimos que seria necessário um reforço da fundação e um reforço da estrutura existente para aguentar o novo projeto,” disse Newton.

Foi preciso fazer uma demolição controlada, o que significa criar uma nova estrutura provisória antes de demolir a antiga, e depois transformar a provisória em definitiva. Ou seja: trocar o pneu com o carro andando.

Andre Simoes

“E tudo isso na Paulista, que tem uma vizinhança delicada, com muito fluxo,” disse André Simões, filho de Newton e CEO da companhia desde 2019.

“Tivemos que usar um sistema de proteção de fachada para isolar a obra, com um elevador por dentro, para nada ser projetado para fora. Fomos desmontando tudo como se fosse Lego.”

Durante o trabalho, a empresa percebeu que a situação real da estrutura não batia com o que estimou no estudo que fez antes de iniciar a obra.

“Quando fomos demolir os pilares, tinha até caixa de cigarro dentro, com vazios significativos. A estrutura não estava em estado adequado para ser carregada,” André disse.

São pepinos com os quais a Racional já está acostumada a lidar. A empresa não atua em prédios residenciais, que em geral têm processos padronizados, e só encara obras complexas.

Já trabalhou em projetos como o estádio do Atlético-MG; o edifício que abriga o acelerador SIRIUS, em Campinas; o Centro de Ensino e Pesquisa do Hospital Albert Einstein, no Morumbi; e o Teatro Renault.

O novo prédio do Masp terá 14 andares e 7,8 mil metros quadrados, o que vai aumentar em 66% os espaços expositivos do museu. Antes chamado de Dumont-Adams, o edifício foi rebatizado de Pietro Maria Bardi, em homenagem ao marido de Lina.

O projeto envolve cinco novas galerias para exposições, duas áreas multiuso, salas de aula, laboratório de conservação, área de acolhimento, restaurante e café, além de depósitos e docas para carga e descarga de obras de arte.

Durante os trabalhos da Racional, as várias surpresas encontradas também geraram desafios orçamentários. 

Em 2021, o Masp disse que a reforma custaria R$ 180 milhões. Agora, estima que o custo final foi de R$ 250 milhões, um dinheiro que veio de doações de pessoas físicas.

Um dos problemas foi a disparada de preços na pandemia, especialmente depois da crise de fretes na logística global. “O concreto e a metálica descolaram completamente da curva do INCC [o Índice Nacional de Custo da Construção],” disse André.

Segundo ele, ajudou que o Masp é muito cuidadoso com seu planejamento orçamentário, uma vez que o dinheiro vem de doações.

“Por isso procurávamos dar previsibilidade dos custos para dar tempo de o Masp decidir o que fazer, e dar alternativas para contrabalancear os aumentos de custos.”

Daí a importância do envolvimento com o contratante no estudo do projeto antes das obras, porque às vezes a solução arquitetônica não é estruturalmente viável. Da carteira da Racional em construção, cerca de 60% a 70% contam com esse nível de complexidade.

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