Um acionista ressentido. Um influenciador motivado. Os dois contra a Helbor

Um acionista ressentido. Um influenciador motivado. Os dois contra a Helbor
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As acusações de inconsistências contábeis feitas à Helbor – e que causaram uma queda de 12% no papel esta semana – têm por trás o investidor Marcos Antônio de Carvalho, um auditor da Receita Federal que investiu R$ 7 milhões na companhia e viu seu capital derreter ao longo dos últimos anos com a desvalorização da ação.

Antes de fazer as acusações, ele trocou uma série de mensagens com executivos da Helbor para tentar recuperar o dinheiro, e uma das possibilidades era vender suas ações a valor patrimonial, fontes a par do assunto disseram ao Metro Quadrado.

Desconfiando que a queda da ação não se devia apenas a fatores de mercado, o investidor passou a investigar os balanços da companhia em busca de alguma fraude, e seu levantamento serviu de base para um parecer assinado por uma assessoria de contabilidade de Ribeirão Preto, a Black Stream, que diz haver inconsistências no valor total de R$ 1,78 bilhão entre 2013 e 2024.

Com o material em mãos, ele procurou a ajuda de uma instituição fundada no ano passado por Rafael Ferri, o influenciador de finanças que também fundou o antigo TradersClub e é conhecido por um histórico de embates no mercado.

Apresentando-se como uma entidade que defende o interesse dos minoritários, a Associação Brasileira de Investidores no Mercado de Capitais (Abimec) convenceu o auditor fiscal a desistir de seu plano inicial – de partir para uma arbitragem – e a tornar o caso público.

A associação de Ferri tomou a dianteira das acusações e enviou o parecer à Helbor na semana passada.

A empresa já conhecia o documento porque o próprio investidor já havia apresentado a papelada quando tentava recuperar o dinheiro, e se dispôs a marcar uma reunião com a Abimec para esclarecimentos, que não ocorreu.

Na segunda-feira, Ferri compartilhou um trecho das alegações em sua conta no X (onde tem quase 250 mil seguidores), ocultando o nome da Helbor, e dizendo que quem quisesse ter acesso aos documentos deveria se associar à Abimec em seu site.

Não demorou para que o nome da Helbor viesse à tona nas redes sociais, no mesmo dia em que a incorporadora comunicava ao mercado a renúncia do seu CFO, Leonardo Fuchs Piloto.

O Metro Quadrado apurou que Piloto está de saída porque recebeu uma proposta para trabalhar em outra empresa, mas sua renúncia acabou ajudando a alimentar os rumores nas redes sociais, e isso se refletiu na ação da Helbor.

Na terça, o papel experimentou um tombo de 13%. 

Naquele dia, após o mercado fechar, a Helbor enviou uma notificação a Ferri dizendo que a acusação não tinha “qualquer fundamento jurídico ou fático” e foi elaborada por um acionista que “já há algum tempo dissemina informações difamatórias contra a empresa,” como parte de uma “campanha persecutória.”

A empresa diz que não obteve retorno. Ferri, porém, diz que não foi procurado pela Helbor.

A Helbor disse ao Metro Quadrado que considera grave a conduta de influenciadores de mercado que, diretamente ou por meio de CNPJs, repercutem “denúncias vazias, sem qualquer apuração, diligência ou contraditório.”

Entre os supostos problemas apontados na acusação estão majorações indevidas do patrimônio, indevida manutenção de reconhecimento de CEPACs e não reconhecimento de perdas.

A maior inconsistência viria de 65 joint ventures que teriam controle conjunto, mas foram integralmente consolidadas pela Helbor e incrementaram o patrimônio da empresa em R$ 839,2 milhões.

Uma fonte do setor diz que é prática comum entre as incorporadoras incluir no patrimônio líquido consolidado SPEs cuja participação da empresa é superior a 50% e segregar a fatia dos acionistas minoritários apenas nas linhas referentes ao PL do controlador.

A Helbor afirma ter “absoluta confiança na correção e fidedignidade das suas informações financeiras.”

“As informações financeiras da companhia são analisadas tanto por um comitê de auditoria quanto por um conselho fiscal, tendo recebido reiteradamente, ao longo dos últimos anos, pareceres irrestritamente favoráveis à sua aprovação,” disse a Helbor na primeira nota enviada à Abimec.

A relação entre o auditor fiscal e a Helbor começou no início de 2021, quando ele passou a comprar ações até atingir uma posição de cerca de 1%, chegando a se tornar um nome conhecido da diretoria por participar com frequência das calls de resultados.

O investidor apostava na tese de que a Helbor estava muito descontada e que a taxa Selic — que iniciava um ciclo de alta naquele momento após a mínima histórica do início da pandemia — não subiria até patamares muito elevados, o que fecharia o gap nas cotações.

Mas a situação mudou a partir de agosto de 2023, quando a Selic alcançou 13,75% e a Helbor enfrentou um período difícil na Bolsa, recuando quase 40% em apenas três meses.

Foi nessa época que o acionista teria identificado as supostas inconsistências ao analisar o balanço da companhia referente ao terceiro trimestre daquele ano.

Na notificação enviada a Ferri, a Helbor diz que, em sua empreitada, o acionista se valeu do “seu cargo público e de práticas ilícitas.”

Em uma notícia-crime enviada à Procuradoria da República, os advogados da incorporadora dizem que ele teria acessado informações sobre a companhia no sistema da Receita sem qualquer motivação aparente, o que motivou a Helbor a entrar também com uma representação na corregedoria do órgão.

O procedimento na Receita foi encerrado após o auditor-investidor assinar um termo de ajustamento de conduta. Ele segue no cargo, apurou o Metro Quadrado.

Já o Ministério Público Federal ainda está investigando a prática de crimes de abuso de autoridade, violação de sigilo funcional e perseguição.

Entre as provas encaminhadas pela companhia para a investigação há inclusive uma troca de mensagens que mostra o investidor pressionando executivos a marcarem uma reunião entre seu consultor e Henry Borenstein, CEO da Helbor, no Terminal Rodoviário do Tietê, em São Paulo.

No ano passado, o auditor zerou sua posição na Helbor. Procurado, ele não quis se pronunciar.

Ferri, que preside a Abimec, afirmou que a associação consultou outros dois especialistas em contabilidade para checar o embasamento do parecer antes de procurar a empresa na semana passada e divulgar o documento, que segue disponível para os associados em seu site.

“Depois de ter feito essa diligence, nós questionamos a empresa. Foram 120 dias de laudos, avaliações e consultas,” ele disse ao Metro Quadrado.

De acordo com Ferri, a Abimec recebeu duas outras denúncias sobre outras companhias de capital aberto e também apura os fatos antes de questionar as empresas.

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