As dores e a delícia do boom imobiliário de João Pessoa

João Pessoa está tomada por canteiros de obras.
A capital paraibana tem sido um dos mercados imobiliários mais aquecidos do Brasil, com a cidade experimentando um boom de novos moradores.
Segundo o IBGE, a cidade foi a capital nordestina que mais ganhou habitantes na última década, enquanto as vizinhas Recife e Natal registraram queda.
A migração vem de regiões como Sul, Sudeste e Centro-Oeste, que encontraram em João Pessoa um refúgio à beira-mar, preços ainda competitivos e uma orla de 25 quilômetros.
“Temos belezas naturais, qualidade de vida, segurança acima da média e um planejamento urbano que nos destaca,” Cida Medeiros, a CEO da construtora Delta, disse ao Metro Quadrado.
“Há clientes que vieram visitar a cidade uma única vez e decidiram se mudar para cá.”
Em áreas à beira-mar, como Cabo Branco, o metro quadrado já ultrapassa R$ 20 mil, enquanto empreendimentos de médio padrão – a três ou quatro quadras da praia – ficam na faixa de R$ 13 mil a R$ 14 mil.
“Para quem está acostumado com os valores do Rio ou de São Paulo, isso ainda é muito competitivo,” disse Érico Feitosa, o presidente do Secovi-PB.
Há inclusive projetos do Minha Casa Minha Vida para a Faixa 4 do programa, criada recentemente para atender famílias que ganham até R$ 12 mil por mês.
A Delta Engenharia, por exemplo, prepara um lançamento para a categoria no bairro Bessa, a algumas quadras da praia.
“Não conhecemos nenhum outro lugar no Brasil onde isso seja possível,” disse Cida.
A força do mercado local também se explica pelo dinamismo econômico.
A Paraíba foi o segundo estado que mais gerou empregos no Brasil no primeiro semestre, e o seu PIB cresceu 6,8% no ano anterior.
“Estamos vivendo um crescimento de China,” disse André Penazzi, o fundador da incorporadora Setai.
O Plano Diretor é apontado como um dos responsáveis pela preservação do charme local.
Desde os anos 1970, as limitações de altura nos prédios da orla criam um escalonamento que preserva a ventilação e a vista para o mar.
Só a uma distância de 500 metros da praia é possível construir em altura livre.
“Essa legislação impede que a orla vire um paredão de concreto, como vemos em outras capitais, e mantém o equilíbrio entre crescimento e qualidade de vida,” disse Feitosa.
Bairros como o Altiplano ilustram bem esse processo.
Antes restrito a construções horizontais, passou por um boom de verticalização após mudanças no Plano Diretor em 2008.
Hoje, o bairro reúne prédios com vista panorâmica para o mar, e um público que vai de famílias locais a investidores de outros estados.
Ao mesmo tempo em que novos bairros ganham destaque, o perfil de quem compra em João Pessoa se diversifica. Já não são apenas aposentados em busca de sossego ou investidores vindos de outros estados.
Empresas do setor relatam a venda de unidades para casais na faixa dos 30 anos, famílias do interior da Paraíba que querem uma segunda moradia e principalmente nômades digitais.
“Pelo ritmo que estamos vendo, esse movimento ainda está só começando,” disse Marcelo Fam, o CEO da construtora Alliance.
Mas há pontos de atenção que podem desafiar a capital.
Um deles é o trânsito, que já começa a sentir o impacto do aumento populacional e da quantidade crescente de veículos.
“É um problema que precisa ser tratado agora para não comprometer a mobilidade no futuro,” disse Feitosa.
Executivos do mercado defendem investimentos em novas vias, corredores exclusivos e ampliação das ligações com a BR-230 e a PB-008.
Já existem projetos, mas o consenso é que essas intervenções devem demorar a sair do papel, exigindo que o mercado e a população convivam com os gargalos por mais algum tempo.
Outro ponto discutido entre as empresas do setor é a possibilidade de o mercado estar se aproximando de uma bolha imobiliária.
Mas diferentemente de outros destinos turísticos que passaram por altas abruptas, João Pessoa tem experimentado um crescimento gradativo.
De acordo com um levantamento da consultoria Brain, quase 3 mil unidades foram lançadas no primeiro semestre, queda de 34% ante a primeira metade do ano passado, o que mostra algum equilíbrio na oferta.
“Dá para manter esse ritmo de desenvolvimento sem perder o que torna João Pessoa única. Se conseguirmos manter o equilíbrio, temos um ciclo de crescimento garantido por muitos anos,” disse Cida.