EXCLUSIVO. Maior franquia da Lopes pede rescisão de contrato

A maior franqueada da Lopes entrou com um pedido de ‘rescisão motivada’ de seu contrato com a gigante imobiliária, num movimento que pode afetar significativamente as receitas e o lucro da companhia, que hoje vale R$ 240 milhões na Bolsa.
A BSJ Empreendimentos (que opera a Lopes Rio) responde por 46% da receita de franquias da Lopes (LPS) e 21,5% das vendas totais do grupo. A operação do Rio de Janeiro – que tem como sócios os empresários Elcilio Brito e João Pedro Bielinski – ultrapassou as vendas de São Paulo pela primeira vez no ano passado, apesar de operar um mercado 5x menor. Enquanto a Lopes Rio faturou R$ 2,9 bilhões, São Paulo vendeu R$ 2,2 bi.
Dos R$ 20 milhões que a LPS lucrou no ano passado, cerca de R$ 14 milhões vieram dos royalties da Lopes Rio.
O desentendimento que levou ao pedido de rescisão de hoje começou cerca de quatro meses atrás, e envolveu discordâncias dos sócios sobre estratégia, ruídos na comunicação entre eles, e um novo equilíbrio na relação de forças entre franqueadora e franqueada, depois que a Lopes Rio cresceu 10x nos últimos sete anos, enquanto a operação de São Paulo encolheu de R$ 5,5 bi para R$2 bi.
Brito – que trabalha no grupo Lopes há 24 anos, primeiro como executivo, depois como franqueado – estava negociando a renovação do contrato da franquia do Rio, que venceria daqui a dois anos.
Mas ele e Marcos Lopes, o CEO da companhia, pararam de se entender quando Brito propôs comprar uma outra imobiliária no Rio. A Lopes a princípio concordou com a ideia, mas depois levou Brito à Justiça acusando o sócio de quebra de contrato por supostamente tentar competir com a Lopes no mesmo mercado.
“Eu sempre vesti a camisa dessa empresa,” Brito disse ao Metro Quadrado. “Já pensei até em tatuar o coração [logomarca] da Lopes na minha perna. Mas chega uma hora… você tem que admirar seu franqueador, seu sócio, e eu perdi o brilho no olho por esse negócio.”
Quando processou Brito, a Lopes alegou que a Lopes Rio havia comprado uma outra imobiliária – a Sawala – sem sua concordância, o que configuraria uma concorrência contra a própria franqueadora, acarretando numa multa de 36x o valor do royalties mensais, o que daria algo em torno de R$ 40 milhões.
Brito diz que a alegação “não faz o menor sentido, porque nunca chegamos a fechar nenhuma aquisição. Estávamos em uma negociação e avisamos a Lopes e conversamos algumas vezes com eles sobre isso,” disse ele.
Para ele, o processo da Lopes “foi na verdade uma forma de nos pressionar para que a gente fizesse a renovação nos termos que eles queriam.”
No contrato atual, a Lopes Rio transfere para a franqueadora 0,5 ponto percentual das vendas dos imóveis (as comissões são de 4,2% nos lançamentos e de 5% nas vendas no mercado secundário).
No ano passado, isso significou que a Lopes Rio transferiu 28% de sua receita e 68% de seu lucro para a LPS – um valor que Brito considera “absurdo” e “fora dos padrões de qualquer franquia.”
A proposta da Lopes Rio para a renovação era reduzir os royalties para 0,3 ponto percentual das comissões – o que, nos cálculos da empresa, faria com que ela ficasse com 50% do lucro, e a Lopes, com a outra metade. Segundo Brito, foi justamente para compensar a perda de receita da Lopes que ele propôs comprar a Sawala, uma concorrente que estava com dificuldades financeiras e havia procurado Brito propondo a venda.
Havia ainda um benefício adicional: fechar o mercado local, dando à Lopes uma terceira marca no Rio.
A Lopes fez uma contraproposta: manter os royalties em 0,5 ponto para um faturamento de até R$ 1 bilhão e 0,4 ponto para o que excedesse este valor; Brito topou, mas o contrato nunca foi assinado.
“A gente não queria brigar e estávamos dispostos a seguir nesses termos,” disse João Pedro Bielinski, o outro sócio da Lopes Rio. “Mas quando fomos assinar o contrato, eles falaram que não queriam a compra da Sawala porque já tinham outra operação no Rio, a Patrimóvel. Falaram que a estratégia não era essa, e que íamos ter que acatar.”
Com a rescisão do contrato, o plano dos dois sócios é seguir operando com outra marca no Rio.
Com mais de 2.200 corretores, a Lopes Rio é a maior imobiliária do estado, seguida pela Patrimóvel (com vendas de cerca de R$ 800 milhões) e a Sawala (R$ 300 milhões).
A Lopes não deve ficar parada, e vai tentar capturar, com outro operador, parte do mercado que sua franqueada tem hoje. Mas terá que testar a força de sua marca num mercado dominado pelas relações interpessoais com os incorporadores.
Para rescindir antecipadamente, a franqueada vai pagar uma multa pequena prevista no contrato: R$ 1 milhão, que considerando o tempo que faltava, deve significar um desembolso de cerca de R$ 300 mil.
A Lopes disse ao Metro Quadrado que “identificou infração de obrigação contratual pelo franqueado BSJ e seus sócios, o que motivou adoção de medida judicial pertinente, tendo inclusive obtido decisão liminar favorável.”
Segundo a empresa, apesar de seus esforços em fazer cumprir o pactuado entre as partes, “a Lopes foi surpreendida com rumores de que a BSJ romperia o contrato.”
“No entanto, o que há de concreto é uma medida judicial iniciada pela Lopes para que haja o pleno cumprimento do que foi pactuado entre as partes. A Lopes reforça que prima pelo bom relacionamento com seus franqueados e pauta sua conduta pelo cumprimento dos acordos firmados.”
UPDATE: Depois da publicação desta matéria, a Lopes questionou dois números usados pelo Metro Quadrado que tentavam dar ao leitor uma noção da relevância da operação da Lopes Rio para a Lopes.
Os números merecem sim algum reparo. Escrevemos que a BSJ Empreendimentos (que opera a Lopes Rio) responde por 40% da receita das franquias da Lopes e 25% da receita total do grupo. Estamos corrigindo o texto acima para refletir números mais exatos: a Lopes Rio é responsável por 46% da receita de franquias da Lopes (R$ 14,2 milhões de um total de R$ 30,8 milhões), e 21,5% das vendas totais da Lopes, e não da receita total, como afirmávamos no texto original (R$ 2,95 bilhões de um total de R$ 13,7 bilhões).
Isto posto, a Lopes contestou ainda a seguinte afirmação: “Dos R$ 20 milhões que a LPS lucrou no ano passado, cerca de R$ 14 milhões vieram dos royalties da Lopes Rio.”
A Lopes afirma que, em vez dos R$ 14 milhões, a Lopes Rio contribuiu no lucro com apenas R$ 4,9 milhões. A empresa chega a este número deduzindo dos R$ 14 milhões “a alocação proporcional de impostos e despesas diretas da franqueadora” – ou seja, atribuindo um custo de R$ 6,5 milhões diretamente à BSJ.
Mas fazer a alocação proporcional de despesas diretas não parece correto, porque a BSJ opera com muito maior autonomia financeira do que a maioria das franquias.
As despesas diretas da franqueadora com a operação de franquias somaram R$ 15,5 milhões no ano passado, mas, segundo a BSJ, a Lopes incorreu em um custo de apenas R$ 1 milhão de marketing com a Lopes Rio – ou seja, a maioria esmagadora dos custos com franquias foi feito nas outras 169 operações.
Fora aquele R$ 1 milhão, a BSJ não recebe investimentos da Lopes para custos operacionais como treinamentos e abertura de stands de vendas.