Fora do radar, Brasil Terrenos já lucra duas Eztec no Brasil profundo

Quando um assessor da Brasil Terrenos apresentou a companhia de Goiânia ao diretor de um grande banco, o executivo reuniu seu time e deu um esporro: “Como é que ninguém aqui conhece uma empresa desse tamanho?”
A surpresa é compreensível.
Voando abaixo do radar – e fora do eixo Rio-São Paulo – a Brasil Terrenos já faz o segundo maior lucro líquido da construção civil nacional, ficando atrás apenas da Cyrela.
No ano passado, a companhia familiar – que faz loteamentos residenciais em 17 estados – faturou R$ 2 bilhões e fez um lucro líquido de R$ 1,2 bi, uma margem líquida de deliciosos 64%.
Para efeito de comparação, a Cyrela lucrou no ano passado R$ 1,9 bi (com margem de 24,1%); a Eztec lucrou R$ 429 milhões com margem de 27,1%; e a Direcional lucrou R$ 728 milhões (21,1%).
O segredo por trás das margens suculentas da Brasil Terrenos parece ser seu modelo 100% verticalizado, no qual a empresa é responsável pela prospecção dos terrenos, incorporação, construção, vendas, marketing, e até pela gestão da carteira dos clientes, que nunca é repassada para terceiros.
“Isso traz uma complexidade grande para a operação, mas também cria uma fortaleza gigante para a nossa empresa, porque cria um acúmulo de margens e garante a qualidade do nosso serviço em todas as etapas,” o vp de finanças e filho de um dos fundadores, Alexandre Pedreira Pereira, disse ao Metro Quadrado.
O executivo disse ainda que a companhia não faz nenhum loteamento que dê menos que 3x o capital investido. “Essa é a nossa premissa básica para entrar em qualquer negócio, e isso já gera uma margem de 66% no D-0,” disse ele.
Fundada em 2003 com o nome de Buriti Empreendimentos, a Brasil Terrenos nasceu da cabeça de Moisés Carvalho Pereira e Sidney Penna, dois empresários do Pará que tinham negócios em outros setores e viram a oportunidade de empreender na incorporação.
Os sócios começaram com alguns pequenos loteamentos no sul do Pará, e pouco a pouco foram crescendo no entorno do estado, entrando em Tocantins, por exemplo, antes de atingir presença nacional.
A Brasil Terrenos opera com estruturas regionais. Sempre que vai abrir uma região nova, ela entra primeiro com um grande loteamento (de 1.000 a 1.500 lotes), para justificar os custos que terá para abrir a região – o que inclui a abertura de um escritório local para atender os clientes.
Com a estrutura montada, ela começa a fazer loteamentos menores quando encontra boas oportunidades. O valor dos lotes vai de R$ 70 mil até R$ 450 mil.
Alexandre explica que a companhia sempre opera com um parceiro regional, que se torna sócio minoritário da operação local.
“Esse parceiro sempre é alguém com laços muito fortes na região, o que dá credibilidade local. Ele traz a expertise local, os relacionamentos e a capacidade de originar terrenos,” disse ele.
Em Presidente Prudente, por exemplo, os sócios da Brasil Terrenos são os irmãos Constantino de Oliveira Júnior e Henrique Constantino, da GOL. Já em Uberaba, o sócio é um dos herdeiros do empresário Mário Franco, um dos criadores da ExpoZebu e tão relevante na cidade que dá nome ao aeroporto.
A Brasil Terrenos é (de longe) o maior player de um mercado que não para de crescer no Brasil profundo — mas extremamente pulverizado, com players regionais. Outras empresas com atuação nacional incluem a Alphaville (receita de R$ 680 milhões; lucro de R$ 85 milhões), que vale pouco mais de R$ 330 milhões na Bolsa depois de sua ação implodir nos últimos anos, e a Nova Harmonia – das famílias Bretas e Roriz, também de Goiânia – que tentou um IPO em 2021.
Mas há diferenças claras em relação a Alphaville: enquanto Alphaville é focada mais em condomínios fechados, 96% dos projetos da Brasil Terrenos são loteamentos abertos.
“Quando você tem um condomínio fechado, isso gera um custo de carrego do estoque importante, já que enquanto você não consegue vender tem que arcar os custos do condomínio de todos os lotes. Na Brasil Terrenos, eles não têm esse custo de carrego, então mesmo que não venda, você não perde dinheiro,” disse um executivo do setor.
A Nova Harmonia também é focada em loteamentos abertos, mas a interseção de atuação das duas companhias é pequena, de apenas duas ou três capitais.
Outra vantagem do modelo de loteamento aberto é que a Brasil Terrenos constrói não apenas os lotes, mas toda a infraestrutura do bairro, do saneamento à eletricidade.
“Em muitos casos, esse novo bairro vem com uma infraestrutura que boa parte da cidade não tem. Isso faz com que ele vire um dos melhores bairros da cidade, o que é muito bom pra gente, porque conforme ele vai sendo construído os lotes só ganham valor,” disse Alexandre.
O potencial de expansão também é relevante — apesar da companhia já estar em 79 cidades.
Alexandre diz que, pelo perfil das cidades em que atua, a Brasil Terrenos poderia estar em 8x mais cidades do que está hoje. “As moradias no Brasil são majoritariamente horizontais. No interior as pessoas preferem casas, e tem um estudo que mostra que 88% das residências do Brasil são casas, e não apartamentos,” disse ele.
A Brasil Terrenos tem um landbank de R$ 23 bilhões, o suficiente para 188 mil novos lotes. No ano passado, ela lançou 9 mil unidades — um número que deve aumentar para 15 mil este ano.
A expectativa da companhia é manter esse patamar de 15 mil unidades por ano nos próximos anos. Esse volume pode acelerar, no entanto, caso a companhia consiga levar adiante um sonho dos fundadores: fazer um IPO.
Moisés Carvalho Pereira, o pai de Alexandre, pensa em listar a companhia na Bolsa desde 2020, quando fez um curso de sucessão.
“Meu pai assistiu 100% das aulas e quando saiu do curso estava decidido que a companhia tinha que ser de capital aberto. Não porque precisávamos de dinheiro, mas pela perpetuidade do negócio,” disse Alexandre.
Desde então, a Brasil Terrenos estruturou sua governança: montou um conselho com membros independentes, fez finalmente um acordo de acionistas, e ficou pronta para quando o mercado abrir.
A janela ainda não veio, mas os lotes continuam vendendo. No Brasil profundo, a crise é menor que na Faria Lima.