Na era das redes sociais, corretores sobem o sarrafo da profissão

O corretor de imóveis está deixando de ser o patinho feio das profissões no Brasil.
Em um passado não muito distante, era visto apenas como um profissional insistente, pouco preparado e com um discurso decorado, preocupado mais com a comissão do que com o cliente. Só quem não tinha para onde correr ia para esse mercado.
Ainda é fácil encontrar esse perfil nos plantões de vendas das incorporadoras, mas há uma nova geração que está buscando sofisticar o atendimento e tem contribuído para melhorar a imagem da carreira.
São profissionais que se valem das redes sociais para fazer vídeos com carisma, como a paulistana Tamara Stief no Instagram, que já viralizou algumas vezes.
Foi no YouTube que Guilherme Pilger explodiu, com vídeos de imóveis de Balneário Camboriú, e vários corretores receberam reacts de Casimiro Miguel enquanto mostravam casas de luxo à venda.
O upgrade da profissão também provocou transições de carreira, atraindo o personal stylist Yan Acioli e o ator Marcello Antony.
E já há até realities que exploram esse universo, como o Selling Sunset, da Netflix, e o The Real Estate Brasil, lançada pela RedeTV! no ano passado.
Mas só o glamour não paga as contas. O que a profissão exige também mudou.
Se antes o corretor se resumia a um intermediário da compra, hoje atua também como um consultor de lifestyle, já que muitos dos clientes estão em um momento de transição de vida.
“Não dá para ser só exibicionismo. O cliente chega cheio de dúvidas, e nosso papel é mostrar se a Vila Nova Conceição é melhor que o Itaim, e se o bairro se encaixa no estilo de vida dele,” Lucas Melo, o fundador da imobiliária MBras, disse ao Metro Quadrado.
A escolha de um imóvel não é mais apenas sobre metragem e número de quartos. Envolve discutir trânsito, rotina, escolas, proximidade do trabalho e até o tipo de vizinhança que se deseja.
“Estamos presentes quando o casal compra o primeiro apartamento, depois quando chega o filho, e até quando o casamento termina,” disse Lucas.
Regulamentada no Brasil desde o dia 27 de agosto de 1962 – e por isso a data virou o dia nacional do corretor de imóveis – a carreira conta hoje com cerca de 650 mil profissionais ativos em 2025, um aumento de 60% em apenas cinco anos, segundo o Cofeci.
Isso coloca o País como o segundo do mundo com mais corretores e imobiliárias em atividade, ficando atrás só dos Estados Unidos.
Além das mudanças que a própria profissão está vivendo, o mercado de imóveis está mais aquecido no Brasil, o que demanda mais profissionais.
Em 2024, cerca de 400,5 mil imóveis foram vendidos no Brasil, segundo dados da CBIC, mais de três vezes o nível de 2019, de 130,5 mil.
Dados do Cofeci mostram também que os corretores estão mais jovens. Nos anos 1970, os profissionais tinham 60 anos em média, caindo gradativamente até chegar a 38 anos.
Entre aqueles que se arriscam nesse mercado, muitos tiveram uma experiência ruim como cliente e viram nisso uma oportunidade para fazer diferente.
Foi o caso de Sandra Canellas, que hoje trabalha em uma franquia da imobiliária americana Re/Max em Campinas e mudou sua concepção da profissão depois que passou a atuar no mercado.
“Eu achava que o corretor era aquele senhor da pastinha, distribuindo panfletos na porta da padaria,” disse.
“Mas a venda não acontece sem vínculo. Tem que entender o filho, o cachorro, o escritório, até a sogra entra na equação. É um trabalho de confiança.”
É um modelo de trabalho que se aproxima do que já está consolidado nos Estados Unidos, onde o corretor tem status de consultor estratégico.
“Em Nova York, trabalhamos em parceria com outros corretores. No Brasil, ainda existe a tentativa de cortar o corretor para economizar comissão, ou de atravessar um colega para fechar o negócio sozinho. Isso cria desconfiança e prejudica todo mundo,” disse Harry Nasser, o brasileiro que trabalha no escritório nova-iorquino da Sotheby’s International Realty.
Outra demonstração de força da carreira no Brasil passa pela sobrevivência às startups.
O surgimento de players como QuintoAndar sugeria inicialmente que o corretor poderia perder importância, mas as próprias plataformas perceberam que o profissional era peça importante da engrenagem e passaram a reforçar o relacionamento.
O QuintoAndar tem hoje cerca de 5 mil profissionais parceiros em 70 cidades, e eles fecham em média 1,6 contrato de compra e venda por mês, até cinco vezes mais que a média do mercado.
“Nenhum aplicativo vai conseguir substituir o vínculo humano que essa profissão demanda,” disse Lucas, da MBras.
A proptech Pilar foi uma que viu nos corretores um filão, ao oferecer tecnologias que ajudam nas vendas, como mapas interativos das cidades.
A corretora Denise Molinaro, da Pilar, diz que a barreira de entrada da profissão é muito baixa, mas é possível se diferenciar.
“Eu sinto que ainda somos pouco respeitados, mas quando você traz informação concreta, dados de mercado e conhece cada detalhe do bairro, o cliente aprende a confiar.”