O potencial construtivo que virou moeda de troca no Rio

O potencial construtivo obtido por retrofits do programa Reviver Centro abriu portas para a criação de um mercado secundário no Rio.
Incorporadoras que atuam na revitalização de prédios antigos passaram a vender os metros quadrados adicionais gerados pelas obras para empresas interessadas em viabilizar projetos em bairros da Zona Sul — onde o uso do potencial é permitido.
Essas negociações, que variam conforme o volume e o formato de pagamento, movimentam valores em torno de R$ 2 mil a R$ 2,5 mil por m², segundo executivos ouvidos pelo Metro Quadrado.
Com a circulação desses créditos, corretores e incorporadoras monitoram quem está gerando potencial e quem precisa complementar a área, o que faz as negociações surgirem de forma orgânica.
“É como se fosse uma moeda. Eu posso vender uma parte do potencial, assim como posso colocar uma parte dele em um projeto nosso. É fracionável,” disse Vasco Rodrigues, o CEO da Fator Realty.
A incorporadora está retrofitando um prédio do arquiteto Lúcio Costa, na Candelária, e aguarda a emissão da certidão de potencial para vender uma parte dos metros quadrados.
A receita com a venda de parte do potencial também tem ajudado a viabilizar financeiramente os projetos do Centro, onde o valor de venda das unidades é menor e a margem é mais apertada.
Entre as operações já realizadas, a SIG Engenharia comprou mais de 8 mil m² de outras incorporadoras.
“A obra no Centro não gera um resultado tão bom, porque custa quase o mesmo preço de Copacabana. Para quem faz o retrofit, o que compensa é vender esse crédito, porque é como se estivesse vendendo o apartamento com um valor mais alto,” disse Otávio Grimberg, sócio-fundador da SIG Engenharia.
Nos imóveis enquadrados como retrofit comum, as incorporadoras recebem 0,6 m² de potencial para cada metro requalificado.
Já nas áreas consideradas prioritárias pelo programa — ou nos casos em que o projeto incorpora unidades de habitação social — o benefício pode chegar à proporção de um para um.
A RJDI também comprou 4,5 mil m² de duas incorporadoras, gerou outros 2,2 mil m² e vendeu 1,5 mil m² para dois incorporadores interessados em usar o benefício.
“Há incorporadores que fazem proposta de pagar parcelado, então tem negociação para tudo que o mercado precisa,” Jomar Monnerat, o sócio-fundador da RJDI, disse ao Metro Quadrado.
Ao mesmo tempo que essas negociações passaram a ser mais comuns, o tempo se tornou uma variável decisiva para quem compra e para quem vende.
A lei do Reviver Centro prevê um período inicial em que o uso do potencial pode ser feito sem pagar nada de outorga ou com desconto quase total, mas esse benefício não é permanente.
Nos dois primeiros anos após a sanção da lei, alguns empreendimentos puderam utilizar o crédito sem pagar outorga, enquanto outros começaram com abatimento de cerca de 90% — uma diferença que depende da área onde o potencial é aplicado e do tipo de intervenção realizada no prédio original.
Desde então, a aplicação do crédito passou a envolver uma outorga que cresce progressivamente com o tempo até alcançar o valor cheio previsto na legislação.
Na prática, quanto mais distante da criação do programa, maior o percentual cobrado para usar o potencial.
Essa progressão altera a conta de todos os lados. Para quem gerou potencial no Centro, significa que manter um estoque parado por muito tempo reduz o ganho esperado.
E para a incorporadora que pensa em comprar, além do valor pago pelo crédito, precisa considerar o peso da outorga futura no custo total do projeto.
“Se hoje compro um potencial que vale uma coisa, e amanhã quando uso vale outra, ele vai ser menos atrativo para as empresas investirem no Centro,” disse Vasco, da Fator Realty.







