Paisagismo brasileiro desabrocha à sombra das tamareiras em flor

Paisagismo brasileiro desabrocha à sombra das tamareiras em flor
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Há uma tamareira crescendo no jardim do seu vizinho.

A palmeira que dá tâmaras e é originária do Norte da África está se tornando uma presença mais frequente em projetos paisagísticos no Brasil — basta o dono da casa topar desembolsar R$ 30 mil por árvore (com cerca de 3 metros de tronco).

“Para os clientes que, além de dinheiro, têm bom gosto, plantas como as tamareiras estão na moda e vendendo cada vez mais,” disse Fernando Junqueira, da Árvores & Cia, que fornece plantas para todo o País a partir de seu sítio de produção em Dona Euzébia, no interior de Minas.

O paisagismo está mudando de patamar no Brasil. Dos refúgios de fim de semana na Quinta da Baroneza às mansões de veraneio em Trancoso, hoje é impensável uma casa de altíssimo padrão ser projetada sem o input de um paisagista.

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Com visão técnica e autoral, os paisagistas passaram a trabalhar com incorporadores e arquitetos desde a concepção dos projetos, buscando aliar os desejos dos clientes às especificidades de cada terreno e região. 

Foi-se o tempo em que um jardim ocupava as sobras não construídas de um lote. Agora, áreas verdes, gazebos e piscinas se tornaram elementos-chave de um projeto, estrategicamente dispostos após a análise do posicionamento e do nível da casa, dos recuos, da insolação, dos ventos e das vistas.

Não por acaso, o paisagismo está abocanhando uma fatia cada vez mais relevante dos orçamentos imobiliários de alto padrão no País — e sendo exportado. 

Um projeto assinado pelo premiado arquiteto Marcio Kogan, por exemplo, pode custar entre R$ 10 milhões e R$ 20 milhões, dos quais 10% correspondem ao projeto paisagístico.

Enquanto isso, paisagistas renomados como Renata Tilli e Daniel Nunes têm sido convidados para projetos internacionais e estão abrindo escritórios no exterior, do Caribe à Europa.

Depois de muito se inspirar em tendências internacionais, os paisagistas brasileiros vivem um momento cada vez mais autoral, bebendo da fonte de Burle Marx e preferindo usar a vasta gama de espécies nativas do País.

“As plantas nativas estão sendo mais valorizadas porque respeitam o bioma e atraem a fauna local,” disse Renata. “Essa tendência transborda para algo que permite a manifestação espontânea da natureza em vez de algo [com aspecto] ensaiado.”

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No Sul e no Sudeste, principalmente no litoral, há muitas opções de árvores, palmeiras, arbustos e herbáceas nativas disponíveis no mercado, tanto pela facilidade de cultivo quanto por crescerem com alguma agilidade. Já no Cerrado e em regiões de serra a oferta é mais restrita.

Daniel cita sanquésias, jabuticabeiras, ipês, jacarandás, helicônias, alocásias e filodendros como algumas das espécies nativas que mais tem utilizado.

Ele afirma, no entanto, que as exóticas — como são chamadas as plantas de outras origens — são bem-vindas em seus projetos. 

“Muitos clientes não sabem distinguir o que é nativo ou exótico e chegam com ideias próprias. Cabe a nós avaliar questões de bioma, estética, insolação, água e interação entre as espécies. Eu defendo sempre o bom senso, a coerência estética e a técnica,” disse.

Nativa do México, a costela-de-adão está entre as exóticas mais utilizadas pelo paisagista. Já entre as mais pedidas pelos clientes estão as oliveiras e as sete-copas africanas, assim como as tamareiras.

Seja por conta de memórias afetivas ou da busca por estilos de vida mais naturais, os donos das casas também têm pedido que os projetos contemplem hortas, pomares ou até espaços para o cultivo de pequenos animais.

“Os clientes adoram ter o que colher e comer em casa,” disse Renata. “Muitos têm preferido viver, inclusive, em loteamentos rurais do que em condomínios. Tenho feito casas pequenas e escondidas no meio da vegetação — refúgios da loucura tecnológica.”

Tendências à parte, algo que permanece igual é a ansiedade dos donos das casas em ver o seu jardim “pronto”. E no menor tempo possível.

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Leva de seis meses a um ano para desenvolver o projeto paisagístico após a concepção do projeto arquitetônico e, depois de sua implementação, cerca de dois anos para o jardim atingir sua plenitude, a depender do bioma em que a casa está inserida.

Com o auxílio da tecnologia — a produção de plantas evoluiu, assim como as ferramentas de transporte, de retirada de plantas adultas e de abertura de covas — os paisagistas têm conseguido entregar jardins com um aspecto mais finalizado desde o dia um.

“Parte do nosso desafio é mostrar que a construção de uma casa pode ser tão prazerosa quanto o resultado final. O jardim é um ser vivo: impacto, volume e privacidade também são construídos com o tempo,” disse Daniel.

“Mas hoje é possível escolher uma jabuticabeira de 10, 20 ou 50 anos, o que requer níveis de investimento distintos e influencia o tempo necessário para a maturação do jardim.” 

A evolução do mercado é igualmente fruto de um trabalho cada vez mais próximo entre paisagistas e produtores, que juntos ditam as espécies disponíveis no mercado.

“Os produtores têm tentado antecipar as tendências do mercado, e nós os aconselhamos, indicamos linhas estéticas e definimos projetos que acabam orientando a produção,” disse Daniel. “O planejamento precisa ser de longo prazo, o que torna essencial o alinhamento entre as partes.”

A família de Renata realiza um trabalho de pesquisa e cultivo de plantas nativas e exóticas no interior de São Paulo há 100 anos.

“Recebemos mudas e sementes de pesquisadores, paisagistas e parceiros que sabem que seremos multiplicadores destas espécies, proporcionando o acesso de todos a elas no futuro,” disse.

Paisagismo Renata Tilli

Na primeira foto, um projeto paisagístico assinado por Daniel Nunes na Quinta da Baroneza; Na segunda, um jardim de Renata Tilli na Fazenda Boa Vista.

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