Juro menor vai aumentar venda em shoppings, diz Pedro Carraz

O gestor do maior fundo imobiliário de shoppings da Bolsa está otimista com o setor em 2026.
Pedro Carraz, o sócio da XP Asset responsável pela vertical de real estate da gestora, acredita que o início do ciclo de queda da Selic já deve se refletir em resultados operacionais melhores no ano que vem.
“Em um ambiente de juros menores, com um pouco mais de renda sobrando no bolso do brasileiro, parte disso se converte em venda nos shoppings e mais aluguel,” ele disse ao Metro Quadrado.

A confiança de Carraz se reflete nas últimas transações feitas pelo XP Malls, o maior fundo de shoppings do País em termos de patrimônio líquido (R$ 6,3 bilhões) e base de cotistas (627 mil investidores).
O fundo comprou participações em 19 imóveis nos últimos 18 meses, incluindo a aquisição de seis ativos da Syn Prop e Tech por R$ 2,1 bilhões e o deal pelo Pátio Higienópolis feito em parceria com a Iguatemi.
Por outro lado, na visão de Carraz, o início da queda dos juros não deve interromper a tendência de consolidação da indústria de FIIs, porque o ano de 2026 ainda seguirá com Selic elevada e incertezas macroeconômicas.
“Gestoras com tamanho pequeno ou muitas vezes até intermediário acabam tendo dificuldade de atrair os melhores talentos, porque têm dificuldade de gerar receita, lucro e, consequentemente, capacidade de pagamento,” ele disse.
Abaixo, os principais trechos da entrevista com o gestor do XPML11.
O XP Malls fez uma série de operações que envolveram tomada de risco em momentos em que o mercado estava difícil e a gestão foi muito criticada. Esse é o dilema da gestão ativa em FIIs?
Em fundos de renda variável, renda fixa ou crédito privado, não é um tabu comprar e vender diariamente porque são ativos líquidos e facilmente transacionáveis. Já nos FIIs, sobretudo os de tijolo, estamos falando de transações que levam meses porque tem negociação, diligência, escritura e muitas vezes envolve a submissão da operação ao Cade, então muita gente ainda enxerga FII como uma espécie de buy and hold.
Mas nós temos uma visão diferente. A gestão ativa também passa por fazer a compra e venda de imóveis, à medida em que percebemos que aquele imóvel não tem mais tanto upside, ou que já cumprimos a nossa tese, ou que ele ficou muito pequeno para o fundo.
Toda vez que alguém me pergunta se tem alguma coisa à venda, eu respondo: nada está à venda, mas tudo é vendável pelo preço certo.
Quais benefícios essas transações trouxeram no sentido de lapidar o portfólio?
Melhoramos as vendas por metro quadrado em aproximadamente 10% e o NOI por m² cresceu 15%, pois vendemos ativos que não estavam tão alinhados ao portfólio em termos de qualidade. Também vendemos ativos em que, por alguma razão, tínhamos participação majoritária, o que não é nosso pensamento de médio e longo prazo. Desde o IPO do fundo sempre preferimos participações minoritárias onde o nosso sócio seja também o administrador e, portanto, esteja alinhado no equity e interesses no longo prazo.
A partir de agora o XP Malls vai atuar em qual ponta da indústria: compradora, vendedora ou ambas?
Pretendemos continuar atuando nas duas pontas, mantendo a mesma perspectiva de lapidar o portfólio, gerar valor para o cotista e eventualmente desinvestir em participações, que, por alguma razão, ficaram pequenas demais ou já não se enquadram mais na estratégia de médio e longo prazo.
Deve sair algum anúncio nos próximos meses?
É possível, temos trabalhado tanto em compras como em vendas. Obviamente ainda são negociações em diferentes estágios e neste momento não temos nada assinado. Tão logo tenhamos avanços nessas conversas vamos comunicar ao mercado.
Como vocês lidam com os ruídos que essas transações geram com os cotistas, principalmente de varejo, durante o ciclo em que elas ainda estão sendo concluídas?
A indústria de fundos imobiliários evoluiu muito e isso trouxe um aumento muito relevante do número de investidores. Vejo com naturalidade que movimentos de gestão ativa gerem indagações, durante o processo e após, sobretudo na XP onde os fundos que têm uma quantidade grande de investidores. O Maxi Renda, por exemplo, que é o maior fundo da indústria, tem mais de 1,3 milhão. Temos hoje aproximadamente R$ 24 bilhões em patrimônio líquido sob gestão, é impossível não ter problemas em um ativo ou eventualmente em um fundo.
Mas trabalhamos sempre visando minimizar esses problemas e com o máximo de transparência possível, tentando diminuir eventuais questionamentos ao dar visibilidade, não só por meio de comunicados a mercado e fatos relevantes, mas também com explicações nos relatórios mensais e trimestrais.
Falta algo na prateleira da XP hoje?
Estamos avaliando entrar em outros segmentos. Em 2025, por exemplo, entramos em renda urbana. Alguns anos atrás fizemos uma incursão no segmento de lajes corporativas, mas neste momento não estamos mais no setor. Também já estivemos em hotelaria, mas não é um setor que faz parte do nosso planejamento estratégico, pelo menos de curto e médio prazo. Recebemos também oportunidades em multifamily já há muitos anos, e acreditamos que o setor pode e deve se desenvolver muito ainda no Brasil. Mas, na nossa visão, essa equação financeira ainda gera uma série de dúvidas, então decidimos não entrar.
Preferimos ter menos fundos, porém mais consolidados, maiores e que sejam flagships nos seus respectivos segmentos, do ponto de vista de tamanho, de liquidez, de visibilidade do mercado e de qualidade de ativos, do que meramente ter uma quantidade maior de fundos somente para dizer que estamos em todos os segmentos.
A indústria deve continuar se consolidando mesmo com os juros em queda?
Sim, porque é saudável para a indústria ter fundos maiores, mais diversificados e mais líquidos. Gestoras com tamanho pequeno ou muitas vezes até intermediário acabam tendo dificuldade de atrair os melhores talentos, porque têm dificuldade de gerar receita, lucro e, consequentemente, capacidade de pagamento.
A consolidação vai continuar acontecendo, sobretudo num cenário que em 2026 ainda é bastante conturbado do ponto de vista macroeconômico, tanto sob a ótica de juros, que, ainda que tenham algumas quedas, permanecerão em dois dígitos, como de uma eleição presidencial que tende a trazer bastante volatilidade para os mercados. Estamos sempre abertos a olhar oportunidades de crescimento inorgânico, mas estamos mais preocupados com qualidade do que com quantidade. Se aparecerem transações, sejam de gestoras ou de fundos, que contemplem ativos de qualidade e que estejam na precificação adequada, vamos analisar.
O que você vê de mais promissor para 2026?
O ambiente de queda de juros é animador para todo o real estate, sobretudo para o tijolo, porque incentiva consumo, a expansão das empresas e diminui o custo de capital. Continuamos com uma visão bastante otimista principalmente para shoppings e galpões logísticos. O ecommerce vem surpreendendo ano após ano e entendemos que os grandes tomadores de área continuarão locando pelos próximos anos, sobretudo os novos players que tem entrado no Brasil, como os asiáticos. No caso do shopping, o brasileiro adora e ele é um ambiente cada vez mais completo e agradável, com lojas, lazer, alimentação e serviços. Em um cenário de juros menores, com um pouco mais de renda sobrando no bolso do brasileiro, não tenho dúvida que parte disso se converte em venda nos shoppings e mais aluguel.
E o setor de lajes?
O setor de lajes vem tendo uma recuperação bastante forte nos fundamentos econômicos, porém os FIIs ainda estão bem descontados em bolsa. Já o crédito é a parcela do portfólio que traz resiliência e tranquilidade no longo prazo, menos volatilidade e um carrego interessante, seja em CDI ou em IPCA.
A CVM está promovendo uma consulta para atualizar a legislação dos FIIs. O que você acha que precisa mudar?
Uma das mudanças que vem sendo discutida é a possibilidade de recomprar cotas, que é algo que as empresas de capital aberto já fazem, cancelar essas cotas e devolver capital para a acionista. Vários dos fundos que têm essa intenção precisam atualizar os seus regulamentos e passar por assembleias, então um grande avanço que a indústria poderia ter é o fim da necessidade de quórum qualificado, que hoje é de 25% para algumas das matérias. A indústria é muito pulverizada (hoje, na média, nossos fundos têm 80% do passivo do patrimônio líquido na mão de pessoa física e 20% na mão de institucionais), então ainda é uma tarefa complexa obter aprovação de 25% da base.







