Quanto vale uma fachada ativa? Nem as incorporadoras sabem

Nem com leilão as fachadas ativas estão desencalhando.
A incorporadora You,inc levou cinco fachadas comerciais para a plataforma de leilões de imóveis Bayit em uma tentativa inédita de transformar o que virou dor de cabeça em liquidez.
O modelo foi apresentado como a primeira venda estruturada de fachadas ativas por meio de leilão no País.
Mas o resultado não poderia ser mais revelador sobre o impasse que ronda esse mercado: nenhuma das unidades recebeu um único lance.
As lojas estão em Pinheiros, Brooklin e Vila Mariana. O preço mínimo pedido pela incorporadora girava em torno de R$ 8 mil por metro quadrado.
Cada fachada registrou em torno de 1,6 mil visualizações. No mesmo portal, um apartamento no Campo Belo atraiu 1,5 mil visualizações, recebeu 50 lances e foi arrematado por R$ 3,5 milhões.
O imóvel era avaliado em R$ 4,5 milhões, e o primeiro lance partiu de R$ 2,7 milhões.
“A diferença é que no apartamento o mercado encontrou o preço. Já na fachada ativa, o incorporador ainda precifica como se fosse residencial,” Avraham Dichi, o CEO e fundador do portal Bayit, disse ao Metro Quadrado.
Essa estratégia de criação de concorrência poderia ser uma saída para as fachadas, mas o mercado não parece disposto a baixar o preço logo de cara.
“Quando o leilão parte de um preço mais baixo, é possível descobrir qual é o ponto de equilíbrio do mercado. Embora ainda não seja uma prática comum, os leilões podem ser úteis justamente para isso,” disse Claudio Bernardes, o vice-presidente do Secovi-SP.
As fachadas ativas foram incluídas no Plano Diretor de 2014 como uma tentativa de dar vitalidade às ruas em áreas adensadas da cidade.
Entre os benefícios, as lojas de fachadas ativas não consomem o coeficiente de aproveitamento dos projetos. Dependendo do zoneamento, também é possível aumentar a área construída de 20% a 50% sem pagar outorga adicional.
E a fachada ativa é obrigatória em terrenos acima de 10 mil m² próximos a estações de metrô ou corredores de ônibus.
Na prática, as incorporadoras passaram a fazê-las apenas para garantir os benefícios previstos, entregando ao mercado lojas que nem sempre são bem planejadas.
Segundo a Associação Comercial de São Paulo, entre 60% e 80% dessas fachadas estão desocupadas, muitas vezes sem sequer uma placa de aluga-se.
O problema não está apenas no excesso de oferta.
Especialistas apontam falhas técnicas em diversos projetos, desde pé-direito inadequado até a falta de áreas para carga e descarga, ventilação insuficiente e ausência de vagas de estacionamento.
Além disso, o tempo de maturação do setor imobiliário não acompanha o ritmo do varejo. Muitas lojas chegam prontas ao mercado em regiões onde não existe demanda imediata.
“Os próprios incorporadores falam: a fachada ficava meio que com o que sobrava. Todo mundo que fez fachada ativa lá atrás fez errado. Sem critério nenhum, sem projeto,” disse Avraham.
“A incorporadora é especialista em residencial. Ela não sabe vender loja, porque a loja representa uma fração muito pequena do empreendimento. É aí que começa o problema da precificação.”
Apesar do quadro, ele acredita que ainda há espaço para mudança.
A aposta da Bayit é estruturar leilões desde o lançamento de novos empreendimentos, oferecendo as fachadas já no início, com preços mais realistas.
A plataforma está negociando com incorporadoras para leiloar fachadas no Morumbi e na Freguesia do Ó, com valores iniciais em torno de R$ 4,5 mil por metro quadrado.
“O mercado precisa de liquidez. Ninguém pode se dar o luxo de deixar ativos parados. O leilão é uma forma de acelerar esse processo e descobrir o valor real,” disse ele.
Enquanto isso, o cenário urbano segue marcado por fachadas fantasmas. Nas poucas que funcionam, predominam redes de conveniência e serviços como Oxxo, Minuto Pão de Açúcar e Itaú.
“A vacância está alta e os incorporadores dizem que querem construir melhor. Mas e o que já foi entregue?,” disse Avraham.







