O tempero dos FIIs para atiçar o apetite dos investidores

A cozinha dos fundos imobiliários está tendo que ser criativa na hora de elaborar seus cardápios de investimentos.
Com a Selic alta reduzindo o apetite dos investidores por ofertas, as gestoras têm buscado fugir do feijão com arroz, e tentam adicionar algum tempero para continuar captando, ainda que montantes menores.
O prato tradicional – uma estrutura que emite cotas com a promessa de renda com dividendos – já não vende mais como antes, e isso está escancarado no desempenho das ofertas desde que a taxa básica de juros voltou a subir, em setembro.
Entre aquele mês e janeiro, os FIIs levantaram R$ 14,5 bilhões, queda de 36% ante igual intervalo do ano anterior.
O azedume geral fez algumas vítimas: o Patria desistiu de uma oferta que pretendia levantar R$ 538,5 milhões para seu FII de papel, enquanto a Rio Bravo cancelou a captação de R$ 400 milhões com seu fundo de shoppings.
O novo fundo de logística da JiveMauá poderia correr o risco de se juntar à lista de cancelamentos, não fosse uma mudança de rota da gestora.
Inicialmente, a casa considerou lançar um FII tradicional de renda. Mas para atrair capital e colocar o fundo de pé, percebeu que teria que ser mais criativa.
Assim, a estrutura tradicional dos FIIs deu lugar a uma operação com uma cota sênior voltada para o público em geral e rentabilidade prevista de IPCA + 9% e uma cota subordinada para investidores qualificados que pode entregar um dividend yield de 12%.
Segundo Brunno Bagnariolli, sócio e CIO da estratégia de imobiliário da casa, a estratégia foi pensada para atender à maior demanda dos investidores por rentabilidade com previsibilidade e segurança.
“O fundo imobiliário entrega isso nos dividendos, mas muitas vezes não entrega nas cotas,” ele disse ao Metro Quadrado.
O resultado da operação foi uma captação de R$ 1,2 bilhão em janeiro para comprar galpões da Icon Realty – a empresa de real estate de Michael Klein.
“Eu tenho confiança em dizer que se tivéssemos ido pela via tradicional, mesmo com a distribuição da XP, o nome da JiveMauá e bons ativos sendo comprados a um bom preço, não conseguiríamos captar tudo que captamos,” ele disse. “Só o arroz com feijão não está funcionando, é preciso colocar um tempero.”
Já a Suno Asset pensou em outro caminho para o seu Fundo de Fundos (SNFF11).
A estratégia foi abrir mão de uma captação apenas em dinheiro novo e oferecer a possibilidade de troca de posições para investidores alocados em outros produtos.
“Identificando algumas oportunidades em tesourarias e investidores com posição em fundos que são bons, estavam em um preço interessante para comprar e para carregar, mas não tinham dividend yield,” o CIO da gestora, Vitor Duarte, disse ao Metro Quadrado.
A tática de trocar a posição original por um fundo mais líquido e diversificado gerou uma demanda maior que a esperada, mas a Suno optou por limitar o pipeline.
“Recusamos uns R$ 300 milhões em negócios que não achamos adequados. Ou seja, deixamos de captar um total de R$ 400 milhões, mas é porque queremos que o fundo cresça sem perder a qualidade.”
O fundo pretendia levantar R$ 152 milhões quando lançou sua emissão, em agosto do ano passado, mas encerrou a operação em fevereiro com R$ 106,7 milhões.
Apesar do montante menor, a gestora diz que ficou satisfeita. “R$ 100 milhões é muito dinheiro para um fundo que tinha R$ 250 milhões de patrimônio antes da oferta. A nossa ancoragem era só de R$ 30 milhões, então conseguimos R$ 70 milhões com o varejo e investidores institucionais,” Duarte disse.
É provável que o mercado precise ser criativo por mais algum tempo. O Banco Central deve elevar a Selic hoje em mais 1 ponto percentual, para 14,25%, e há dúvidas no mercado sobre possíveis novas altas.
Mas as gestoras acreditam que o cenário estará mais estabilizado no segundo semestre.
“O nível de juros máximo já estará dado e aí começa a discussão de quando irá cair e até que patamar. E é nesse momento que os ativos de risco respiram um pouco,” diz o gestor da Suno.
Já Brunno Bagnariolli, da JiveMauá, espera que o ano continue seguindo a mesma dinâmica atual, apenas com ofertas menores, de fundos não listados ou com algum “coelho na cartola”.
“Todo mundo espera que no último trimestre o mercado ainda esteja com juros altos, mas com perspectiva de melhora. E aí pode ser que a indústria tente antecipar esse movimento e os preços subam, mas não estou contando com isso para pagar as contas.”