Nem o alto padrão está escapando do baque da Selic

Nem o alto padrão está escapando do baque da Selic
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A Selic está perto de completar quatro anos no patamar de dois dígitos – e o mercado de alto padrão está dando sinais de que já não consegue resistir tanto quanto antes aos juros elevados.

Os corretores que vendem imóveis acima de R$ 1,5 milhão – considerados mais resilientes por atrair compradores que dependem menos de financiamento bancário – estão tendo mais dificuldade de convencer o cliente a retirar o dinheiro da renda fixa.

Para a conta valer a pena, os potenciais adquirentes têm exigido um pedágio financeiro significativo, segundo Cyro Naufel, diretor da imobiliária Lopes.

“Esse cliente já costuma cobrar uma oportunidade de negócio do incorporador e agora vai tentar negociar um preço ainda mais vantajoso,” Naufel disse ao Metro Quadrado.

As vendas, que já não eram rápidas na comparação com outros segmentos, podem demorar ainda mais.

“Não é aquele tipo de cliente que está passeando no final de semana, entra num plantão e faz a compra, então normalmente a tratativa já levaria uns 30 dias. Hoje está demorando dois ou três meses,” disse o diretor da Lopes.

A matemática joga ainda mais contra o incorporador quando se trata de imóveis na planta, de acordo com Peixoto Accyoli, CEO da rede de franquias imobiliárias RE/MAX Brasil.

Para Peixoto, nesse caso o cliente considera não apenas o patamar da Selic, mas também a correção monetária durante o ciclo de construção do imóvel, que costuma ser de 18 a 36 meses.

Durante essa janela, o saldo devedor é usualmente reajustado pelo INCC, indicador que acumula alta de 7% em 12 meses.

“Se deixo o dinheiro no banco com a taxa de juros como está, posso comprar este mesmo imóvel em 24 meses ainda na planta e com mais rentabilidade.”

Além disso, o affordability para quem quer contratar um financiamento imobiliário também piorou, de acordo com simulações da RE/MAX.

A renda mensal mínima necessária para financiar uma propriedade de R$ 2 milhões em 360 meses, por exemplo, passou de R$ 52.948 em 2023 — quando os juros estavam em um ciclo de queda — para R$ 61.009 neste ano.

Os frutos desse cenário começam a aparecer nos números de algumas das incorporadoras que lançam projetos de alto padrão e já publicaram prévias operacionais do terceiro trimestre.

A Mitre, por exemplo, reportou uma queda de 13% em vendas líquidas na comparação com o mesmo período do ano passado.

O BTG Pactual disse em relatório que o resultado foi afetado principalmente pelo ritmo mais lento que o esperado nas vendas de estoque.

Um dos projetos icônicos da companhia, por exemplo, o Daslu Residences, vendeu 20,6% desde seu lançamento, em dezembro.

A Melnick, outra companhia que trabalha com o segmento, também reportou uma queda de 9% nas vendas. Novamente, a comercialização do estoque impactou o indicador.

Em ambos os casos, o BTG afirma que os resultados refletem um cenário mais sombrio para o médio e alto padrão dada à deterioração do affordability.

Esse efeito ainda não aparece nos dados agregados do setor. O segundo trimestre mostrou crescimento de 34,3% nas vendas de imóveis acima de R$ 1,5 milhão, segundo o balanço da consultoria Brain.

Mas os lançamentos já demonstram uma estagnação.

Nas cidades cobertas pelo Índice de Lançamentos Imobiliários (ILI) do Grupo OLX, foram lançadas 4.979 mil unidades entre janeiro e agosto, um pouco abaixo dos 5,2 mil registrados no mesmo período de 2024.

E no mercado secundário, os leads gerados por cliques em anúncios na cidade de São Paulo cresceram apenas 1,5% no acumulado de 12 meses até julho deste ano.

“O cliente de alto padrão normalmente mora bem, então não é uma compra de necessidade imediata. Olhando o recorte do que já foi comprado nos últimos 12, há estabilidade,” disse Guilherme Werner, sócio da Brain.

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